A Igreja mudou os
Mandamentos de Deus? (3)
Os Mandamentos de Deus e os Mandamentos da Igreja
https://www.ofielcatolico.com.br/2001/05/os-mandamentos-de-deus-os-da-igreja.html
RECEBEMOS EM NOSSA caixa de e-mails, de
um leitor que se identifica pelo pseudônimo "Edu," a seguinte
mensagem:
“Há alguns ramos protestantes que acusam o catolicismo de ter alterado os
mandamentos de Deus. Há até mesmo aqueles que acusam a Igreja Católica
Apostólica Romana de ser o cumprimento de Daniel 7:25. Gostaria de fazer duas
perguntas: Os mandamentos do catecismo são essencialmente os mesmos de Êxodo
20? Por que há alguma diferença entre eles? É devido a alguma mudança ou ao
resumo das leis contidas no Novo Testamento?
E qual é a interpretação oficial da Igreja sobre Daniel 7:25?"
Prezadíssimo Edu, em primeiro lugar agradecemos pela confiança depositada em
nosso apostolado. Antes de qualquer análise a respeito dos temas que você
propõe, é fundamental entender que "o cristianismo não é a religião do
livro", como disse o grande Papa Bento XVI na Exortação Apostólica Verbum
Domini, e foi assim esclarecido pelo biblista Pe. Giorgio Zevini: “O
cristianismo é a religião da Palavra de Deus (que não se limita às Sagradas
Escrituras, sendo um conceito muitíssimo mais amplo), e não do livro; não de
uma palavra escrita e muda, mas do Verbo Encarnado e Vivente (Jesus Cristo)”.
Nós não somos judeus: somos cristãos. Os antigos judeus se baseavam
exclusivamente nas Escrituras para saber o que era certo e o que era errado.
Eles tinham como única regra de fé e prática a Bíblia hebraica, que era (e é)
composta da seguinte maneira:
• O Mikrá, mais popularmente chamado Tanakh, constituído
dos livros da Lei, a Torá ou Chumash,
que é o conjunto dos cinco primeiros livros da Bíblia cristã, chamado
Pentateuco);
• Os oito livros dos Profetas ou Neviim;
• Os onze livros chamados Escritos ou Ketuvim.
Dizendo de modo mais simples, as Escrituras que eles observavam são os livros
que compõem o Antigo Testamento da nossa Bíblia cristã. Quando vemos, na
Bíblia, alguma alusão às "Escrituras", refere-se sempre ao conjunto
ou a algum destes livros.
O costume da maioria dos antigos judeus, nos tempos do Antigo Testamento, era
simplesmente "fazer o que estava escrito, e não fazer o que não
estava escrito". Assim se resumia a sua espiritualidade. Justamente por
isso foram tão duramente criticados por nosso Senhor; sua observância era
apenas ritual, enquanto que seu espírito estava longe: "Este povo somente
me honra com os lábios; seu coração, porém, está longe de mim" (Mt
15,8-9).
Em outra oportunidade, Jesus falou diretamente do erro de pensar que o Caminho
e a Vida podem ser encontrados somente pelo estudo das Escrituras: "Vós
examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna. Pois são
elas que testemunham de mim, e vós não quereis vir a Mim, para terdes a vida”
(Jo 5,39-40). – "Julgais ter nelas a vida eterna", diz o Senhor,
mas estão enganados! Não se pode chegar a Deus somente por meio da leitura da
Bíblia. Estudavam muito a Escrituras, achavam que nelas encontrariam todas as
respostas, mas não procuravam o Senhor! Qualquer semelhança com certos
"bibliólatras" que conhecemos hoje não é mera coincidência.
Além disso, como acabamos de ver, as Escrituras observadas pelos judeus são os
livros do nosso Antigo Testamento, e todas as vezes que Jesus ou os Apóstolos
falam em "Escrituras", estão se referindo a esses livros, pois,
evidentemente, no tempo em que eles estavam no mundo a Bíblia cristã ainda não
existia.
Muitos dos ditos "evangélicos" de hoje em dia são rápidos em citar
determinadas passagens da Escritura, como por exemplo o Salmo 119, que diz:
"Lâmpada para os meus pés é tua Palavra", imaginando que o salmista
está se referindo à Bíblia que eles levam debaixo do braço(!). Com isso tentam
provar que o cristão deve se basear exclusivamente nas Escrituras para viver a
sua fé, e que a Igreja não é importante. Mas eles não entendem o óbvio: na
época em que esse Salmo foi escrito, o Novo Testamento da Bíblia, – que é o
eixo e o cumprimento de toda a Escritura, para o cristão, – simplesmente não
havia sido escrito. Logo, não é da Bíblia cristã que ele está falando.
Essas pessoas também não param para pensar que foi a Igreja Católica que,
guiada pelo Espírito Santo, produziu o Novo Testamento, determinou quais livros
seriam canonizados para compor a Bíblia como a conhecemos, copiou-a e
preservou-a através da História, para que chegasse até nós, hoje. A verdade é
que sem a Igreja não haveria a Bíblia, e não o contrário.
Hoje, porém, depois de Jesus Cristo, graças a Deus nós vivemos nos tempos da
Nova e Eterna Aliança! Somos membros da Igreja, que é o Corpo Místico de Nosso
Senhor Jesus Cristo na Terra. Por isso, não há sentido algum nessa obsessão de
achar que é preciso sempre encontrar na Bíblia alguma palavra que
confirme tudo o que a Igreja diz ou faz. Até porque a própria Bíblia diz que é
a Igreja "a coluna e o sustentáculo da Verdade" (1 Tm 3,15), e diz
ainda mais: "Não há dúvida de que vós sois uma Carta de Cristo, redigida
por nosso ministério e escrita, não com tinta, mas com o Espírito de
Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, em vossos
corações" (2Cor 3,3). Sendo assim, é à Igreja que devemos
recorrer para entender e interpretar a Bíblia, e não o contrário.
Esse novo e maravilhoso tempo, em que agora vivemos (e que deveríamos
verdadeiramente viver, de todo coração e alma), já havia sido profetizado desde
os tempos antigos: "Eis a Aliança que farei com a casa de Israel: Oráculo
do Senhor, incutir-lhe-ei a minha Lei, gravá-la-ei em seu coração. Serei o seu
Deus e Israel será o meu povo!" (Jr 31,33). – Somos nós, os cristãos, a
nova Israel. Devemos gravar a Lei de Deus em nossos corações, e esta é a Lei do
Amor (Mt 22,36-40)! Deus espera ser buscado em Espírito e em Verdade (Jo 4,24),
e não mais na letra morta da Lei, pois “A letra mata, mas o Espírito
Vivifica” (2Cor 3,6).
** Fique claro que nada do que
dissemos até aqui diminui a importância fundamental da Sagrada Escritura, que
é, sim, Palavra de Deus em forma de Livro Sagrado, e que é, sim,
extremamente útil para a nossa instrução. Apenas demonstramos que a própria
Bíblia Sagrada nos ensina que devemos ir além do que está escrito, seguindo o
Cristo que é Presente entre nós, como membros da única Igreja que Ele nos deu
(Mt 16,16-19), Igreja que é seu Corpo (1Cor 12,27 / Ef 4,12 / Rm 12,5), Igreja
que é a Casa do Deus Vivo e fundamento da Verdade (1 Tm 3,15), única Igreja na
qual comungamos Corpo e Sangue, Alma e Divindade do próprio Cristo, em santa
Intimidade (1Cor 10,16).
Esclarecidos esses pontos essenciais, passamos às questões que você trouxe.
Infelizmente, são muitos os que inventam calúnias para tentar denegrir a Igreja
de Cristo, mas o importante é notar que isso acaba também se constituindo
em mais uma prova de que somos a autêntica Igreja, pois o
próprio Senhor nos alertou que seria assim: "Sereis odiados de todos por
causa do meu Nome" (Mt 10,22). Você pode facilmente observar que o ódio de
todos, sejam ateus, comunistas, homossexuais, "vadias", protestantes,
espíritas, esotéricos, modernistas, etc... é sempre direcionado em primeiro
lugar contra a Igreja Católica Apostólica Romana.
Os Mandamentos de Deus
É claro que a Igreja Católica não mudou
os Mandamentos do Antigo Testamento. Isso simplesmente não existe. O que a
Igreja fez, com a autoridade que lhe foi conferida pelo próprio Senhor Jesus
Cristo, foi sintetizar os Mandamentos, – porque eles foram dados a Moisés para
a condução de um povo específico, num tempo específico, conforme uma situação
específica e no contexto da Antiga Aliança. – Aqui é preciso reafirmar a
importância fundamental de assumir que vivemos agora no tempo da Nova e Eterna
Aliança em Cristo.
A Igreja, pois, sintetizou os
Mandamentos no contexto do Novo Testamento, assim como foram aperfeiçoados por
Jesus com o seu ensinamento e o seu exemplo. Todos os pontos
essenciais dos Mandamentos de Deus, todavia, permanecem; todas as
orientações de Deus estão fielmente mantidas. Vejamos:
1) Amarás a Deus sobre todas
as coisas;
2) Não tomarás o Nome de
Deus em vão;
3) Santificarás as festas;
4) Honrarás a teu pai e a
tua mãe;
5) Não matarás;
6) Não cometerás atos
impuros;
7) Não roubarás;
8) Não dirás falso
testemunho nem mentirás;
9) Não consentirás
pensamentos nem desejos impuros;
10) Não cobiçarás os bens
alheios.
Digno de nota é que as pessoas que se
apresentam como muito preocupadas com a fidelidade à letra são as mesmas que
arrancaram de suas Bíblias sete livros inteiros (Tobias, Judite, Sabedoria,
Baruc, Eclesiástico, I Macabeus e II Macabeus e fragmentos dos livros de Ester
e de Daniel) que sempre constaram da Bíblia, desde os primeiros exemplares
impressos, e que eram observados pelos próprios Apóstolos.
Os Mandamentos da Igreja
]
Já os Mandamentos da Igreja são diferentes dos Mandamentos dados por Deus ao
povo hebreu no deserto. E por que é que a Igreja tem também os seus próprios
mandamentos? Mais uma vez, porque vivemos agora o novo Tempo da Graça. Como é
que Deus haveria de dar a ordem a Moisés, por exemplo, para que o povo não
deixasse de comparecer à Celebração do Sacrifício do Cristo, aos domingos, se
naquele tempo ainda não existia a Missa? Como daria o mandamento de comungar
Corpo e Sangue do Cordeiro de Deus, se o Cordeiro ainda não havia sido imolado,
pois o Senhor ainda não havia se oferecido na Cruz?
Assim, os Mandamentos da Igreja são uma
espécie de complemento aos Mandamentos de Deus, e se referem mais específica e
diretamente a nós, povo cristão. E foi Cristo mesmo quem deu poderes à Sua
Igreja a fim de estabelecer os meios para a salvação da humanidade. Ele disse
aos Apóstolos: "Quem vos ouve a mim ouve, quem vos rejeita a mim
rejeita, e quem me rejeita, rejeita Aquele que me enviou" (Lc
10,16). E disse ainda mais: “Em verdade, tudo o que ligardes sobre a
Terra, será ligado no Céu, e tudo o que desligardes sobre a Terra, será também
desligado no Céu.” (Mt 18,18)
Ele falava aos Apóstolos, que eram a
Igreja no seu primeiro início. Logo, a Igreja legisla, isto é, define suas
leis, com o Poder de Cristo. Quem não a obedece, desobedece a Cristo, logo,
desobedece a Deus Pai. Assim, para a salvação do povo de Deus, a Igreja estabeleceu cinco
obrigações que todo cristão tem de cumprir, conforme ensina o Catecismo. São
eles:
1) Participar da Missa
inteira nos domingos e outras festas de guarda e abster-se de ocupações de
trabalho;
2) Confessar-se ao menos uma
vez por ano;
3) Receber o Sacramento da
Eucaristia ao menos pela Páscoa da Ressurreição;
4) Jejuar e não comer carne,
quando manda a Igreja;
5) Ajudar a Igreja em suas
necessidades.
O Livro do Profeta Daniel, cap. 7,
vs. 25
A passagem de Daniel, 7,25, diz o
seguinte: "(Esse reino) proferirá insultos contra o
Altíssimo, e formará o projeto de mudar os tempos e a Lei; e os santos serão
entregues ao seu poder durante um tempo, tempos e metade de um tempo".
É um trecho um pouco complicado para os
leigos, mas bem simples para os bons teólogos, que sabem que se refere à
política de infidelidade a Deus de um governante chamado Antíoco Epífanos, que
foi contra a observância do sábado e das festas judaicas. Esse fato você pode
conferir no primeiro capítulo de 1Macabeus (vs. 41 a 52).
É claro que essa passagem não tem
absolutamente nada a ver com a Igreja Católica, e no final do
versículo está a prova definitiva: fala em "um tempo, tempos e metade de
um tempo", e nós sabemos que está se referindo a três anos e meio, pois
cada "tempo", nesse caso, representa um ano. Para confirmar isso,
você pode ler no capítulo 4, versículo 13 do mesmo livro de Daniel: fala em
"sete tempos". Pois bem, o estudo histórico (e exegético do texto
original em hebraico) revela que se refere, aqui, a sete anos. Então, "um
tempo, tempos e metade de um tempo", significa um ano (um tempo), mais
dois anos (plural sem definição, segundo o costume, são dois; se fossem três ou
mais seria dito 'três tempos', ou 'quatro tempos', etc.), mais metade de um
tempo (meio ano). Total, três anos e meio.
E assim, vemos claramente que o profeta não pode estar ser referindo à Igreja
Católica, que existe há dois mil anos; lembre-se que contra ela todo tipo de
falso profeta já "profetizou" que acabaria, no correr dessa longa
história.
A única coisa que podemos fazer pelas
pobres pessoas que acreditam em mentiras tão estúpidas e diabólicas quanto essa
é rezar por elas. E tentar instruí-las, sempre que tivermos a oportunidade.
Para isso, precisamos nós próprios procurar a reta instrução, como você e a
maioria dos nossos leitores fazem. Assim como diz o primeiro Papa: "Estai
sempre prontos a responder, para vossa defesa, a todo aquele que vos pedir a
razão de vossa esperança" (1Pd 3,15)... Deus certamente irá abençoá-los
por isso.